Vendo fantasmas: o ato de criação queer em Lembro mais dos Corvos
Resumo
Pensar em um cinema queer é refletir sobre como o audiovisual, com suas estratégias estético-narrativas, pode contribuir para uma proposta antinormativa de gênero e sexualidade. Partindo da noção de que uma série de filmes contemporâneos tem concretizado esse propósito por meio da encenação de um ato de criação queer (Silva, 2021), este artigo pretende identificar tal ato no cinema brasileiro contemporâneo, especificamente no olhar fílmico onisciente da atriz e roteirista trans Julia Katharine no documentário Lembro mais dos Corvos (Gustavo Vinagre: 2018). Combinando um exercício de análise fílmica com a metodologia proposta pela Teoria dos Cineastas (Penafria, Baggio, Graça & Araujo 2016), a investigação busca examinar como o diálogo de olhares encenado por Katharine e Vinagre no filme in/subverte não apenas a relação histórica sujeito/objeto na produção documental, mas também a própria tradição de objetificação e/ou apagamento de corpos trans pelo cinema. Por meio da sua capacidade de contar histórias e do seu vasto conhecimento cinematográfico, a protagonista estabelece uma colaboração de coautoria com o cineasta que faz do corpo trans, e do olhar trans, sujeitos da narrativa. Como resultado, Corvos afasta-se da noção ultrapassada de documentário como gênero em que a realidade simplesmente acontece e é capturada pelo olhar genial do realizador, evidenciando a mise-en-scène e os aspectos cinematográficos inerentes ao filme, e como Katharine é corresponsável pela sua criação.
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Direitos de Autor (c) 2024 Daniel Oliveira Silva, Ana Catarina dos Santos Pereira
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Artigo aceite em 2024-01-23
Artigo publicado em 2024-02-29